terça-feira, 19 de julho de 2011

O dia que nunca existiu

Acordou cedo. Os olhos estavam cansados dos preparativos da véspera, não a decepcionaria.
Tomou o café rapidamente, folheou os jornais com displicência.

-Olá. Você chegou cedo. Disse-lhe beijando-a de leve nos lábios.
-Assim você tira meu batom, um pouco menos de euforia nesses cumprimentos.
-Pra mulher da minha vida.
As mãos estavam trêmulas ao tocar o ramalhete que ele ofertara a si. As flores airosas envolviam-lhe a cintura, os lábios, toda ela; como ele faria sem hesitações; num dado momento recuou como que se estivesse sendo acuada por perigoso animal,olhou pra ele como se o visse pela primeira vez num show de horrores.
-O que tens Val?
-Acabou.
-Como assim acabou?Em pleno 12 de junho você só tem isso pra me dizer?
-Só. Não deu explicações, deixou as belas rosas na mesinha do restaurante,não voltariam a ver-se.
Olhei tudo aquilo atônito, até o momento não saberia dizer o que ou por que as coisas terminaram, pra mim estávamos começando, pra ela já era o último capitulo, daqueles de muita audiência; o público ali era imenso; engoli meu orgulho e sai de fininho, cabeça erguida como se nada tivesse acontecido e na verdade nada havia ocorrido, fui somente notificado de algo; como o fim de um contrato indesejado pra uma das partes.
Não chorei. Não gritei ou tentei dissuadi-la naquele momento nem posteriormente. Em casa ainda tonto com a situação havia uma ideia martelando dentro de mim:
-Esse dia não existe. Apague-o.
Primeiro passo foi ir até a lata de lixo da rua e jogar as flores fora, depois vieram os presentinhos, cartinhas, fotos, endereços, coisas compradas juntos, e uma listinha interminável disso ou aquilo que os casais insistem em acumular, mas que eu estava deixando pra trás ou melhor destruindo vestígios,todos eles.
Os últimos e decisivos passos foram rasgar o dia 12 do calendário da folhinha e apagar do celular aquela data, como não consegui fazer aquilo quebrei o aparelho em pedacinhos assim resolvia de vez dois problemas: o da presença infame da data como também o da criatura resolver ligar. Naquele ponto da história ela não era mais meu amor e sim uma coisa, uma coisa que um dia inventei e agora estava deixando partir.

2 comentários:

  1. Parabéns Cecilia,o conto tá maravilhoso, continue assim sendo essa amiga maravilhosa que vc sempre foi. muito sucesso e felicidades

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  2. Perde-se a conta dos dias que nunca existiram...
    A memória nos apronta e traz antigas lembranças de momentos que queremos apagar com inútil teimosia..

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