-Pra
onde vamos hoje?
-Ih, o
dia tá tão morgado. Melhor ficar em casa.
-Então o
dia não está morgado. Corrigiu a outra. Morgada está você.
Riram
ambas. Mas o riso de Ana estava triste.
-O que
há Ana? Disse a amiga.
-Desde
que a empresa em que eu trabalhava fechou não consegui outro emprego. A
situação lá em casa está difícil.
-É aqui
em casa as coisas também estão difíceis. Mentiu a outra. Baixou os olhos
fingindo uma lágrima. Ou talvez fosse a vergonha batendo-lhe a porta depois da
falseta?
O caso é
que não tardou em despedir a outra. Contudo algumas semanas depois podemos encontrá-las
mais uma vez juntas.
Ana abraçou
a amiga com sinceridade e a consolou, esta se acolheu em seus braços, pois sofria terrivelmente.
Havia alguns dias a sua mãe acabara de morrer num acidente de carro.
Júlia
parecia mais confortada depois das palavras de consolo de Ana. Ainda permaneceram um pouco juntas.
-Quer
vir comigo a igreja? Disse Júlia.
-Vamos
sim. Foram juntas, mas juntas não voltaram.
Em
verdade Júlia procurava a igreja não por crer em realmente em Deus, mas como
que para aliviar a própria consciência. Ao ver Ana ir embora Júlia lembrou-se
por um momento que a outra havia perdido o emprego, tinha filhos e era viúva.
-Júlia! Disse
alguém ao vê-la ali parada na entrada da igreja.
Era uma jovem que a convidava para um
aniversário que seria nos próximos dias e diante daquele convite festivo ela
esqueceu todo o resto, inclusive que sofria. E não só ela. A amiga também
deveria estar sofrendo. Mas depois se ocuparia disso. Era necessário comprar o
presente da aniversariante, ver a melhor roupa, ah ainda tinha os sapatos. Quase
não os tinha.
Do outro
lado da cidade havia uma mulher que sentia fome assim como os seus filhos.
Estava cansada, pois tinha naquele dia andado muito para ver sua amiga. Ana não
tinha religião, mas acreditava fervorosamente que uma força de superioridade
angélica havia criado todo o universo e os homens que nele habitavam.
Júlia
deve está sofrendo muito. Pensava consigo mesma. Mal sabia ela que a amiga
havia encontrado divertimentos capazes de fazê-la esquecer não só suas dores
mas também as do próximo.
No dia
da referida festa estava lá a nossa Júlia, bonita e muito bem vestida. Mas
nenhum dos convidados veio apertar-lhe a mão ou saber se sofria. A maioria
deles estranhava ela estar ali depois de tão pouco tempo da morte de mãe, mas
que tinham com isso? Pensava ela, que acreditava merecer também o seu quinhão
de felicidade, eu particularmente não a desminto, mas esquecia-se ela de coisas
mais importantes.
Em meio
aquela multidão convulsa ela estava só. Embora ostentasse felicidade ela
verdadeiramente não a tinha. Fechou os olhos e viu Ana a sua frente, Ana e seus
filhos passando fome. Por que não ajudar aquela tão boa amiga que a havia
consolado em sua tristeza?
-Já está
indo embora Júlia? Era o Almeida. Um homem de seus 35 anos. Muito bonito.
Está
sentiu horror ao olhá-lo. Era a primeira vez que sentia aquilo ao olhar alguém.
Um medo indefinido. Desvencilhou-se de suas mãos que a seguravam pelo braço e
saiu.
-Júlia.
Gritou ele ainda uma vez com a intenção de atraí-la de volta.
Ela já
não o ouviu. Longe dali mas bem perto de
seu coração havia alguém que ela precisava ver, saciar a fome, mas não só de
comida, de compaixão e amor humanos; pois “quem dá aos pobres empresta a Deus”.
Bem escrito,mas não gosto de finais melosos.
ResponderExcluirLG
Você reclama dos finais tristes também, pois costuma dizer que sou muito má com meus personagens..Assim fica difícil entender você.rs
ResponderExcluirAbração
:)