Tirou as sandálias e colocou-se ao encontro do mar,
depositou sua oferenda. Agradeceu a oxalá pela volta do José Ramos, seu melhor
amigo. Acabara seu exílio.
Foram anos afastados, não sei se pelo exílio ou por
que ele se casara, ou ainda por que já não gosto de MPB e ele continua a
venerá-la. Exceto pelo casamento ele continuava o mesmo. As mesmas gargalhadas,
as mesmas bizarrices. Outro domingo desses fomos tomar uma gelada na praia, sol
aberto, mar agitado.
- Como foram os últimos anos?
-Foram anos de tempo agitado. Muito burburinho lá na
política....Você sabe...Dizem que sou um escritor subversivo, que escrevo pros
pobres. Impediram a publicação do meu livro: “Baraúna: O Vulto Negro”.
-Mas também Zé você tocou na ferida deles...
- Coloquei apenas álcool iodado, se doeu, já não é
comigo.
-Você não muda nunca.
-Já você... Não deixo de sentir uma ponta de
decepção quando olho pra você velho Zuza. Abandonou todas as lutas. Está num
emprego insosso que não te satisfaz nem um pouco. Isso adianta de quê?
Zuza sentiu sua cara arder de vergonha. Nos últimos
anos estava vivendo escondido de si mesmo, como se fosse outra pessoa... Um
heterônimo talvez, só que mais covarde. Olhou pro Zé e viu como ele estava
envelhecido, mais magro, os cabelos escasseando. Teria valido a pena lutar
contra o sistema? A pergunta não saiu, ficou engasgada como um nó atando a vida
daquelas duas pessoas.
-Estou com você Zé.
O outro se virou surpreso com a frase do Zuza.
- Não sou tão subversivo quanto você. Tenho lutado a
minha maneira: calma e silenciosamente todos os dias. Mas queria apenas que
soubesse que estamos juntos.
Gargalharam enquanto viam o garçom trazendo
mais uma cerveja.