sexta-feira, 19 de julho de 2013

Dia" D"

Era um sábado e talvez por isso Márcio acordasse tarde aquela manhã.
-Márcio! Isso são horas de um pai de família está dormindo? Deixe de preguiça e levante.
Márcio esfregou os olhos, estava ainda muito sonolento. Que horas seriam?
-Levante homem.
Rafaela já estava irritada com toda aquela preguiça e lentidão do marido.
-Sabe homem? Você não presta pra nada. Nem pra trazer comida pra casa. Eu devia te vender no bazar da igreja. Será que alguma doida iria te querer? Ria sozinha. Acho que a doida era ela.
Márcio levantou-se, mecanicamente vestiu-se e banhou-se. Não comeu, pois a mulher o seguia em todos cantos da casa, fosse no banheiro ou no quarto aquele homem não tinha paz.
Olhou bem pra esposa...Estavam casados há mais de 6 anos. E era sempre aquilo. Sempre uma ladainha chata como aquela. Não havia um momento de carinho ou amor. A mulher reclamava até no sexo, será que ele era ruim de cama? Não. A negativa surgiu imediatamente em sua cabeça, o caso não era aquele, não era desse tipo de coisa que ela reclamava na hora “h” e sim de outras tantas coisinhas que haviam ocorrido no dia. Foram anos somando problemas, reclamações e grosserias até olhar bem pra ela como estava olhando agora e ver que não a amava, pra bem dizer a verdade nem saberia dizer o por que haviam casado.
Ele juntou coragem e disse:
-Acabou Rafaela. Esse é o fim dos seis anos juntos.

A mulher parecia verdadeiramente aliviada. Acho que era isso que ela esperava durante esses anos. Enfim ele, um palerma, segundo opinião dela havia tomado uma atitude. Foi naquele momento que ela passou a amá-lo.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

"Quem dá aos pobres empresta a Deus"

-Pra onde vamos hoje?
-Ih, o dia tá tão morgado. Melhor ficar em casa.
-Então o dia não está morgado. Corrigiu a outra. Morgada está você.
Riram ambas. Mas o riso de Ana estava triste.
-O que há Ana? Disse a amiga.
-Desde que a empresa em que eu trabalhava fechou não consegui outro emprego. A situação lá em casa está difícil.
-É aqui em casa as coisas também estão difíceis. Mentiu a outra. Baixou os olhos fingindo uma lágrima. Ou talvez fosse a vergonha batendo-lhe a porta depois da falseta?
O caso é que não tardou em despedir a outra. Contudo algumas semanas depois podemos encontrá-las mais uma vez juntas.
Ana abraçou a amiga com sinceridade e a consolou, esta se acolheu em seus braços, pois sofria terrivelmente. Havia alguns dias a sua mãe acabara de morrer num acidente de carro.
Júlia parecia mais confortada depois das palavras de consolo de Ana. Ainda permaneceram um pouco juntas.
-Quer vir comigo a igreja? Disse Júlia.
-Vamos sim. Foram juntas, mas juntas não voltaram.
Em verdade Júlia procurava a igreja não por crer em realmente em Deus, mas como que para aliviar a própria consciência. Ao ver Ana ir embora Júlia lembrou-se por um momento que a outra havia perdido o emprego, tinha filhos e era viúva.
-Júlia! Disse alguém ao vê-la ali parada na entrada da igreja.
 Era uma jovem que a convidava para um aniversário que seria nos próximos dias e diante daquele convite festivo ela esqueceu todo o resto, inclusive que sofria. E não só ela. A amiga também deveria estar sofrendo. Mas depois se ocuparia disso. Era necessário comprar o presente da aniversariante, ver a melhor roupa, ah ainda tinha os sapatos. Quase não os tinha.
Do outro lado da cidade havia uma mulher que sentia fome assim como os seus filhos. Estava cansada, pois tinha naquele dia andado muito para ver sua amiga. Ana não tinha religião, mas acreditava fervorosamente que uma força de superioridade angélica havia criado todo o universo e os homens que nele habitavam.
Júlia deve está sofrendo muito. Pensava consigo mesma. Mal sabia ela que a amiga havia encontrado divertimentos capazes de fazê-la esquecer não só suas dores mas também as do próximo.
No dia da referida festa estava lá a nossa Júlia, bonita e muito bem vestida. Mas nenhum dos convidados veio apertar-lhe a mão ou saber se sofria. A maioria deles estranhava ela estar ali depois de tão pouco tempo da morte de mãe, mas que tinham com isso? Pensava ela, que acreditava merecer também o seu quinhão de felicidade, eu particularmente não a desminto, mas esquecia-se ela de coisas mais importantes.
Em meio aquela multidão convulsa ela estava só. Embora ostentasse felicidade ela verdadeiramente não a tinha. Fechou os olhos e viu Ana a sua frente, Ana e seus filhos passando fome. Por que não ajudar aquela tão boa amiga que a havia consolado em sua tristeza?
-Já está indo embora Júlia? Era o Almeida. Um homem de seus 35 anos. Muito bonito.
Está sentiu horror ao olhá-lo. Era a primeira vez que sentia aquilo ao olhar alguém. Um medo indefinido. Desvencilhou-se de suas mãos que a seguravam pelo braço e saiu.
-Júlia. Gritou ele ainda uma vez com a intenção de atraí-la de volta.
Ela já não o ouviu. Longe dali mas bem  perto de seu coração havia alguém que ela precisava ver, saciar a fome, mas não só de comida, de compaixão e amor humanos; pois “quem dá aos pobres empresta a Deus”.


sexta-feira, 5 de julho de 2013

Zuza


(Imagem retirada do blog: Fazendo a nossa festa colorir)

-Filó, cadê o Zuza?
-Deve está lá fora brincando.
-O céu tá todo armado. Acho que vai chover. A voz era rouca como se cada palavra tivesse saído com muito esforço das entranhas daquele homem. Roberto era considerado entre os seus um bom pai de família; nunca havia deixado faltar nada para a mulher ou para os filhos: Zuza e Raquel. Em verdade ele era mesmo um bom pai e nutria verdadeira adoração pelo Zuza, via naquele garoto a continuação de si mesmo, uma maneira de perpetuar-se através do tempo, faria dele um grande homem: fiel a seus deveres e compromissos. Além de pai e esposo Roberto era um brasileiro fanático pela pátria de chuteiras, destes que já não há.
-Zuza, oh Zuza! Entre meu filho. Você não tá vendo que vai chover?
-Já vou mãe. Pera mais um pouco.
-Entra agora.
-Mas mãe o jogo tá...
-Nem mais nem meio mais Zuza. Dê tchau aos seus colegas e entre logo. O jogo pode ficar pra outra hora.
-Poxa mãe! Logo hoje que eu ia passar o Zinho na artilharia do time?
Filó fazia-se de surda. Que negócio é esse de artilheiro de time? Filho seu tem é que estudar, por a cara no livro: ser um grande homem.
-E aí filhão? Como foi o jogo?
A partir daí foi um converseiro sem fim sobre a pelada daquele dia, ou sobre o baba como se fala aqui na Bahia. Mas antes de baianos eram brasileiros, adoravam futebol, aliás: os homens da casa gostavam, as mulheres preferiam a novela.
-Roberto, deixa o menino em paz. Para de encher a cabeça dele com isso de ser jogador de futebol, você é um alienado. Não se vive de futebol.
-Como não se vive? Neymar, Fred, Rivaldo e outros e outros mais por aí vivem de que se não é de futebol?
-Estou falando de vida normal.
-E que há de anormal nisso?
-Nosso filho tem é que estudar, ele precisa é se mirar mais no exemplo da irmã. Já viu como a Raquel é estudiosa? Vai ser veterinária, ela já te disse isso? Não né? Você nem olha pra ela. Vive pro Zuza e pra esse seu sonho idiota de fazer dele um jogador.
-Isso não é verdade. Sou um bom pai e você sabe disso.Só que a Raquel não precisa de mim como o Zuza.
-Deixa eu adivinhar! Ele precisa dos conselhos de um jogador de futebol frustrado que nem você? Sabe qual é o teu problema? Você queria ter nascido um Roberto Dinamite, mas fazer o quê? Ele nasceu antes de você, paciência meu bem. Disse Filó irônica enquanto batia no ombro do esposo.
-Quanta bobagem!
A discussão ia longe. Havia ultrapassado o jornal. Já estava na novela das 9 e nada. Até que o Zuza aproximou-se e disse:
-Sabe pai? Não quero mais ser jogador de futebol. Quero fazer novela que nem aquele ator. Ser protagonista ao lado de uma atriz bonita que nem aquela, olha lá.
Roberto estava decepcionado com o Zuza. Filó porém exultava. Havia vencido o marido.