O tom ainda não é esse. Experimentaram cores e
mais cores, até que a mais velha pegou a mais vibrante e disse:
-É essa. Essa que você usará.
A outra estava pálida diante dela, usava uma
blusa branca, calçava chinelos simples, eram pobres, não pelos trajes, mas
pelos fatos que vêm a seguir.
-Olhe pra mim e veja como deve fazer, como
olhar, e se portar diante deles... Falando isso riu ridiculamente, soltando
beijinhos em pleno ar.
A outra via tudo tristemente, entendia aquilo
de forma ainda muito rudimentar, tinha então nove anos, a outra deveria ter uns
12 ou 13, contava dois abortos como triunfo daquela vida que a mais jovem criança
viria a adentrar.
Saíram pelas ruas escuras e estreitas, tétricas
figuras passavam por ali. Tinham medo, Sara a mais nova estava aterrorizada.
-De que tens medo? A mais velha sorriu
ironizando, pois ela também sentia medo.
Outras mulheres circulavam pelo local, criaturas
tão jovens estavam tão velhas e gastas como o vestido dourado esmaecido de uma
delas, humanidade tenha um pouco de piedade dessas mulheres.
Uma criatura estrábica aproximou-se das nossas
meninas, olhou-as com maldade, uma maldade suja e vil, se fosse possível
prendê-lo naquele momento... Não havia polícia nas ruas, não ali.
-Aqui está ela. Como prometi. Disse o
verme pra outra criatura asquerosa com a qual confabulava. Dizendo isso apontou
pra Sara. Leve-a consigo e traga daqui uma hora, quero pagamento adiantado.
-Não pago.
-Ou paga ou não leva. Gritou puxando a arma
pro outro.
“Amabilidades” acertadas levou a garota
consigo. E o que ocorreu meu Deus, fechei os meus olhos pra não ver, tapei os
ouvidos pra não lhes escutar os gritos, mas a minha consciência não me deixa
largar a pena, preciso contar-lhes...Levou-a consigo arrastada pelos bracinhos
finos, toda ela era uma tênue corda de trapezista, e ela estava a minutos da
queda fatal.
A irmã mais velha, encolhida, a metros de
distância daquilo, chorava baixinho, cabeça escondida entre as pernas, o
corpinho tremia e ofegava impaciente. Não rezava, não gritava, apenas grunhia.
Era um animal.
Cambaleante preparava-se pro salto mortal, pra
algo completamente desconhecido. Olhava pra baixo e via o abismo diante de si, era
tão alto, ela sentia tanto medo... Só o corpo dela estava ali, a sua alma
vagueava diante daquele abismo que era a situação na qual se achava.
Clara, a mais velha, num lampejo de compaixão
e lucidez correu até a cena dantesca prestes a consumar-se, atirou-se sobre o
monstro que tentava cruelmente usar sua irmã como um dia fizeram com ela...E
era tão cedo, foi há tanto tempo...Havia sido levada pelos próprios pais, era
tão jovem, tão criança, tão...Já não pensava mais nada, via apenas a face do
homem diante de si, lutando contra ele, numa luta desigual e infame, desferia-lhe
mordidas, que ficavam como nódoas misturadas a batom barato na pele dele.
Os outros que também estavam na rua fugiram, uns
pra não pagar a “corrida”, outras pra levar uma vantagem, por mínima que fosse. Ficaram
apenas as duas ali contra ele... Mortas ambas de pancadas, por um monstro... Corpos
estendidos numa rua qualquer... Eram e ainda são as marcas de batom... Marcas
da prostituição.
Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração contra Crianças e Adolescentes – Disque 100
O Disque 100 funciona diariamente das 8h às 22h, inclusive nos fins de semana e feriados.
Por favor,não passe trotes.
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Esse foi um texto bastante duro e nao sei pq, mas visualizei estes fatos ocorrendo nas ruas da França no seculo XVII.
ResponderExcluirMto bom o texto.
Lobo Branco
Duro sim e realista. Quem dera fosse apenas um texto! Como o ser humano consegue ser tão cruel...
ResponderExcluirMimi
Muito bom o texto Ceci, senti a aflição das meninas =/
ResponderExcluirLi os textos deste blog, gostei. Neste último, as palavras foram bem trabalhadas.
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