Casaram ainda muito jovens.Prometeram diante de um emissário de Deus que aquela união seria eterna.A cerimônia foi muito bonita,muitos convidados...Roupas elegantes,na festa comida farta,nos dias seguintes as coisas não mudaram;ambos atenciosos um para com o outro.Era primavera.
Moravam numa casa confortável,não eram ricos,não tinham empregados;dividiam as tarefas domésticas.Aos poucos estavam descobrindo-se.No príncipio das descobertas Antônia percebeu que o marido,bom,como direi isso?Direi da forma que ela gostaria que eu dissesse então...."Roncava que nem um porco", e mais impressionante era não ter percebido isso antes,por que só agora?Melhor não dar tanta importância a um fato como esse.Lúcio por sua vez começou a achar a esposa um tanto quanto desleixada,não tomava banho com a mesma frequência de outrora,já não se vestia com o esmero dos primeiros tempos; de qualquer forma era de se estranhar...Em pleno verão alguém tomar menos banho que o normal...Mas havia amor entre eles...Devia haver,do contrário por conta de que casariam tão cedo?Tantas pessoas pra conhecer,um mundo inteiro pra desvendar...Escolheram um ao outro.
-O café está frio.
Olhou pra ele com uma pontinha de raiva,deformando os lábios finos e delicados;naquela altura eles pareciam uma cobra ensaiando o bote.Preferiu abortar.
Quem era aquela mulher?Tão hostil,venenosa.Pensou ele vendo a cena a seguir:
Os lábios de serpente puseram-se arqueados diante dele,preparados pra inocular o veneno cruel...Morreria?
-Não temos empregada.Somos somente eu e você.Não gostou?Prepare outro.
Antônia encostou-se na pia,endireitou as mangas da camisa.O frio estava chegando,aos poucos, mas estava;naquela manhã retirou as roupas do armário,lavou,passou,estariam sem mofo pra quando o inverno chegasse...Pra dali um mês ou dois.Já era possível ouvir e ver seus chamados.
Os dias de felicidade comum eram cada vez mais raros.A chuva caia grossa no telhado.O vento entrava até por debaixo da porta.O marido deitado na cama lia o conto: "O Homem da Bolha",a esposa furiosa pela pouca atenção dos últimos meses,arranca-lhe o texto das mãos,puxou também os cobertores e disse:
-Não quero nada seu em minha casa.Há meses aguento seu ronco,sua falta de tempo e sobra de comodismo.
-Você não se enxerga?Olhe-se num espelho.Quem era e quem é você agora?Uma imunda que mal se depila,banho então...Melhor eu me calar,acho que o odor do ambiente fala mais do que qualquer palavra minha.
-Acabou.
-E,só agora Antônia que você notou isso?
-Não,eu notei isso da primeira vez que te trai ainda na lua de mel.
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